terça-feira, 5 de abril de 2011

ENCONTR(AÇÃO): Atrás do Bloco do Pipa, só não vai quem já morreu.

Eliane Andrade ao lado do lambe lambe concebido pelo Mapa Xilográfico e arrancado pela GCM durante a ação do Bloco do Pipa.



Por Diego Marques

(...) Um grupo de "banhistas" chamou a atenção de quem passava na manhã de sábado (02) pelo Viaduto Costa e Silva, no centro de São Paulo. Esticados em esteiras e com equipamentos de mergulho, os "banhistas" organizaram uma praia em pleno Minhocão. O objetivo do grupo, no entanto, não era diversão, e sim protestar contra a política de higienização na região central da capital paulista e contra as violências sofridas por moradores em situação de rua. (...)

É com esta citação que a repórter Patrícia Benvenuti, do periódico Brasil de Fato, descreve a intervenção realizada pelo Coletivo Parabelo, pela Cia Na Corda Bamba de Teatro e pelo Dolores Boca Aberta Mecatrônica de Artes, a convite do Mapa Xilográfico. Intitulada Bloco do Pipa a ação faz parte do projeto  À Deriva Metrópole São Paulo desenvolvido pelos anfitriões e contemplado pelo edital Artes Cênicas da Rua 2010 da Funarte.

A intervenção teve como objetivo denunciar as medidas higienistas que a atual administração pública municipal tem tomado em relação à população de rua locada no centro de São Paulo.  Verticalizando a proposta da lei Cidade Limpa, um caminhão pipa expulsa os moradores em situação de rua a jatos d’água enquanto um caminhão caçamba recolhe os precários pertences dos mesmos – o que, neste dia, não ocorreu diante da intervenção do Bloco do Pipa.

Caminhando na fronteira entre a arte e o ativismo, esta ação aproxima-se do chamado Ativismo Lúdico Midiático. Esta espécie de artivismo procura, ao reconhecer a espetacularização como a linguagem da ideologia dominante, apropriar-se e, acima de tudo, transubstanciar as técnicas do capitalismo espetacular, a fim de transformá-las em ferramentas na luta pela transformação social. Em sua tentativa de esquematização das ações deste ativismo contemporâneo, Stephen Duncombe, em seu livro Dream - Re-imagining Progressive Politics in an Age of Fantasy, propõe aquilo que denomina como espetáculo ético, que para o autor, será diferente do espetáculo hegemônico não só no conteúdo, como também na forma, uma vez que este:

Será participativo: sonho que o público pode modelar e dar forma por si mesmo/Será ativo: espetáculo que funciona apenas se as pessoas puderem criá-lo/Será aberto: criando espaços para formular questões e deixando silêncios para a formação de respostas/ Será transparente: sonhos que as pessoas sabem que são sonhos, mas que ainda possuem o poder de atrair e inspirar/ E, finalmente, não irá encobrir ou substituir a realidade e a verdade, mas antes irá denunciá-la e ampliá-la.

Desta forma, é possível observamos algumas das propriedades da esquematização proposta por Duncombe, durante a passagem do Bloco do Pipa pelo Minhocão: seja no momento em que moradores em situação de rua e transeuntes engajam-se na ação cantando e dançando a marchinha não joga fora lixo ou improvisando um toque do Candomblé com suas ferramentas de trabalho, seja no momento em que Mãe e filha sentam-se em uma cadeira de praia e, sob o viaduto, discutem a privatização do espaço público ou mesmo quando uma mulher bolha e um grupo de banhistas impedem a passagem de um caminhão pipa.

Podemos concluir que, ao afastar-se da lógica e da racionalidade inerentes ao modelo proposto pelo ativismo tradicional e ao aproximar-se da arte, o ativismo contemporâneo abre espaços para que possamos atender nossas necessidades emocionais, assim como as necessidades materiais, em um processo de resistência coletiva através do engajamento político. Portanto, foi por essas, e outras, que ao término da ação, pairou no tempo e no espaço uma sensação de que “(...) atrás do Bloco do Pipa, só não vai quem já morreu (...)”.